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quinta-feira, 18 de agosto de 2011

MARICA MACÊDO DO TIPI

Matriarcados do Ceará: Dona Marica Macêdo




Contemporânea de Dona Federalina, Maria da Soledade Landin, mais conhecida por Marica Macêdo ou Marica do Tipi, nasceu em Missão Velha, no Sítio Gameleira, logo mudando-se para Aurora, onde se casou com José Antônio Macedo, ou Cazuza Macedo dos Terésios. Cazuza Macedo morreu bem cedo, deixando cerca de dez filhos ainda pequenos, nove homens e uma mulher, Joana da Soledade, a preferida de Marica.

Marica e Federalina tiveram muito em comum: uma aliança de defesa mútua que previa desde ajuda com cabras, em determinadas questões, até acobertamento de parentes que tivessem cometido crimes. Não tinham disputas, ambas eram poderosas, situacionistas ferrenhas, sempre no partido do governo, e exerciam com grande violência o seu matriarcado. Mas os pontos comuns terminam por aí. Marica, viúva muito cedo, não guardou eterno luto. Casou-se, apesar da oposição dos filhos, com Antônio Abel, oriundo de Barbalha, junto à Serra do Araripe; ele também viúvo, conhecido por sua burrice incomum, sua tolice sem tamanho, sua grande ingenuidade. Quando os filhos alegaram junto à mãe a imbecilidade do padrasto, ouviram esta resposta ríspida: "Não quero saber se é besta, não quero saber de nada. Quero saber que ele me dê o que eu quero".

A cerimônia do casamento de Marica foi uma verdadeira apologia ao entrelaçamento de famílias. Casaram-se conjuntamente seu irmão, Manoel Inácio da Cruz (Sobrinho-Neto de seu homônimo, sendo este homônimo pai do Major Liberato Manoel da Cruz pg 1093), com Maria Abel, filha de Antônio, e Raimundo Macedo, o Mundoca, filho de Marica, com a prima, filha de Manoel Inácio da Cruz. A festa realizou-se no dia 3 de janeiro de 1903, em Lavras, pois o vigário, Monsenhor Miceno, que ainda não havia se desgraçado com a Dona Federalina, tinha que estar na cidade para celebrar missa por seu aniversário.

A notoriedade de Marica está diretamente ligada à Questão de 1908 ‘Questão 8’, em Aurora. Antônio Leite, irmão de uma das cunhadas de Marica, casada com seu irmão, José Francisco, e grande amigo do falecido Cazuza Macedo, era prefeito, intendente e coletor do município de Aurora, numa época em que as deposições de chefes políticos haviam se tornado freqüentes; justamente o tempo em que Honório, de Lavras da Mangabeira, filho de Dona Federalina, foi deposto pela própria mãe. O tio do prefeito, Teotônio Leite, pai de Vicente Macedo, casado com a filha única de Marica, Joaninha, decidiu depor o sobrinho, chamando os Macêdo para tomarem parte na campanha de deposição. Os filhos de Marica participaram de algumas reuniões, até que a matriarca, usando a sua autoridade, mandou que eles não comparecessem mais às reuniões, dadas as relações estreitas que o prefeito tinha com parentes deles.

Os filhos não hesitaram. Rapidamente avisaram Teotônio Leite de que estavam deixando o movimento, causando um esvaziamento geral. A campanha se apoiava na força e coragem dos Macedo. O coronel Teotônio não perdoou esse falsete e decidiu vingar-se com um cerco ao Sítio Tipi, seguido de um incêndio em todas as dependências. Mas o filho de Teotônio, Vicente Macedo, tratou de avisar a esposa que, para avisar à mãe perfez a galope, no lombo de um cavalo, as quatro léguas, cerca de 24 quilômetros, que separavam a cidade do sítio onde vivia a velha Marica.

Marica, sem perder tempo, reuniu os animais, e partiu com todos rumo a Missão Velha, cujo chefe político, Joaquim de Sant'Anna, era seu parente próximo e do marido; poderia ir também em direção a Barbalha, onde mandava João Raimundo Macedo, o Joca do Brejão, tio de seu primeiro marido.

Na mesma época em que Marica teve que se retirar do Tipi, havia na região uma briga séria entre os Santos, do Sítio do Taveira, e os Leite, com respeito à demarcação de terras ricas em cobre. Quando os Leite chegaram no Sítio do Taveira, à procura de Marica, houve luta, sendo morto seu filho caçula, Cazuza Macedo, de 14 anos, que junto com toda a família estava refugiado no local. Marica não se deixou abalar. Aos filhos que choravam a morte do irmão disse: "Não, deixa disso. Encosta ele num pé de parede e vamos lutar". E ela mesma levou o filho até a parede, retornando à briga.

Aliás, disposição para lutar era o que não lhe faltava. Junto com vários coronéis da região, reuniu cerca de 600 homens, um verdadeiro exército que devastou Aurora em 23 de Dezembro de 1908. Os cangaceiros incendiaram casas e fazendas, estupraram moças de família, guardando o pior tratamento para as pessoas ligadas ao coronel Teotônio Leite. Essa investida dos jagunços, mandados por dona Marica, ajudada pelos coronéis mais fortes do sertão, Domingos Furtado de Milagres, Raimundo Sant'Anna de Missão Velha, o coronel Joca do Brejão e o coronel José Inácio de Barros, não foi reprimida; o grupo de chefes políticos já havia telegrafado ao presidente do Estado, representante dos Acioli, para que retirasse a força policial da cidade. E foram prontamente atendidos.

Depois de ter conseguido reunir seu exército de cabras, Marica Macedo ganhou o respeito do povo e dos coronéis, tendo sido uma das únicas mulheres, senão a única na época, a ocupar um cargo de decisão. Quando seu filho, Antônio Macedo, esteve à frente da prefeitura, o município foi dividido em partes para ser melhor administrado. Coube uma dessas áreas, a que se estendia em direção à Paraíba, à Marica, que aliás foi excelente administradora. Magra, rosto fino, onde se destacava um nariz grande, comprido e afilado, estatura mediana, tinha uma riqueza apoiada no tripé engenho/agricultura/pecuária, que orientava a produção de suas propriedades. Fez do Tipi um famoso coito de cangaceiros, esconderijo perfeito para o espaço ocioso entre uma pilhagem e outra; com eles Marica mantinha ótimo relacionamento, tendo-os à disposição sempre que precisasse.

A matriarca dos Macedo teve estranha morte, em 06/01/1924. Muito religiosa, Marica rezava todos os dias, e em suas preces diárias, pedia que Deus lhe concedesse a graça de jamais ver a morte de outro filho. Certo dia foram chamá-la às pressas no Tipi, pois Joana estava muito doente. As preces de Marica não foram em vão: quando entrou no quarto da filha foi acometida de estranho ataque que a levou à morte instantânea. Não viu morrer a filha, que só veio a falecer três ou seis dias depois. Quando foi feita a exumação dos ossos de Marica, encontraram sua dentadura na altura das costelas. Acredita-se que morreu asfixiada após engolir os dentes postiços.

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Fontes:
Texto Base: Matriarcas do Ceará - D. Marica Macêdo
Autoras: Rachel de Queiroz e Heloisa Buarque de Hollanda

Textos de Apoio: A Estirpe de Santa Teresa - Prof. Joaryvar Macêdo (Joaquim Lobo de Macêdo
Imagem Capturada on-line em  http://cariricangaco.blogspot.com.br/2010/05/cariri-cangaco-visita-o-tipi-de-marica.html

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