Aurora 1908: ataque, invasão e saque*
*(Extraído do livro: Aurora – História e Folclore, de autoria do escritor aurorense Amarílio Gonçalves Tavares).
Capturado de: http://www.aurora.ce.gov.br/cultura/texto.asp?id=93 em 10 de setembro de 2011.
Antecedentes: Em 1908, exercia a Intendência Municipal de Aurora o 'coronel' Antônio Leite Teixeira Netto (1858-1914), Vulgo Totonho Leite.
Totonho havia substituído o seu sobrinho Antônio Leite de Oliveira, grande amigo de José Antônio Macedo, finado marido de D.Marica da Soledade Landim, que residia no Tipi, onde se tornara política de grande influência. Até então, D. Marica Macedo, como era conhecida, a proprietária do Tipi e o cel. Totonho Leite eram correligionários no âmbito estadual, de vez que apoiavam a mesma facção política, que era a de Nogueira Acioli, presidente do Estado. A nível municipal eram adversárias, pois havia disputa pela chefia do município.
O ambiente sócio-político de Aurora era de animosidade. Era de estranhar que houvesse divergências entre D. Marica Macedo e o Cel. Totonho, pois havia estreitos laços de parentesco e afinidade entre a família da primeira e a do segundo. Basta lembrar que Ana Isabel de Macedo, Naninha, esposa de Totonho Leite, era sobrinha de José Antônio de Macedo, primeiro marido de D. Marica e filha deste casal, de nome: Joaninha, casada com Vicente Leite de Macedo, filho do mesmo Totonho Leite.
O município de Aurora limitava-se com o de Milagres, no sítio Taveira. Ali viviam os Santos, que pertenciam ao rebanho eleitoral do Cel. Domingos Furtado. Bafejados pelo poderoso chefe de Milagres, tais indivíduos tentavam constantemente apoderar-se de terrenos de fazendeiros de Aurora, praticando, além disso, espancamentos e arrombamentos de açudes.
As autoridades de Aurora, que eram Antônio Leite Teixeira Netto (Intendente Municipal), Manuel Gonçalves Ferreira (1º Suplente de Juiz) e Róseo Torquato Gonçalves (Delegado), e que já faziam plano de atacar o Taveira, tendo em vista a prática, por pessoas dali de agressões, ora às pessoas, ora ao patrimônio de correligionários do Cel. Totonho. Estas autoridades não tinham mais o que esperar, diante do esbulho causado pela demarcação do Coxá.
Um grave incidente foi o espancamento de um correligionário do Cel. Totonho, de nome José Gonçalves Pescoço, praticado por dois filhos de D. Idalina Santos, cunhada de Seu Cândido do Pavão, revidando agressão sofrida tempos atrás, por Joaquim dos Santos. Ante a queixa apresentada por Gonçalves Pescoço, o delegado Róseo Torquato fez o processo e tratou de prender os Paulinos. O Cel. Cândido, que transferiu os sobrinhos para o sítio Taveira, onde o “cel.” Domingos os garantiria.
O Fogo do Taveira
Em dezembro de 1908, observou-se movimentação de jagunços na faixa Taveira Coxá, em vista do trabalho de demarcação coordenado por Dr. Floro Bartolomeu. Por esse tempo, correram rumores de que os homens reunidos no Taveira preparavam-se para atacar Aurora. Em represália à ofensa causada a Joaquim dos Santos. Manuel Gonçalves chamou Róseo Torquato e lhe disse: Antes que eles venham almoçar aqui, vamos tomar o café lá. O número de capangas a serviço de Totonho Leite era insignificante. Sem um número de guarda-costas com os quais pudesse enfrentar um inimigo que se sabia ser extraordinariamente forte, Teixeira Netto pediu e conseguiu do presidente Nogueira Acioli a vinda dos destacamentos policias de Iguatu e Lavras, num total de 60 praças sob comando do tenente Florêncio. A pretensão do cel. Totonho era capturar os homens que haviam espancado seu correligionário Gonçalves Pescoço e que se achavam refugiados no Taveira, em casa do Cap. José dos Santos.
D. Marica Macedo – peça chave do episódio – foi avisada pela filha Joaninha de que a sua propriedade Tipi seria atacada. A fim de pedir apoio ao Cel. Antônio de Santana e a João Raimundo de Macedo (Joça do Brejão), seus parentes, D. Marica retirou-se com a família, a cavalo, para Missão Velha, indo pernoitar no Taveira, exatamente de 16 para 17 de dezembro de 1908.
Quando a força policial chegou no Taveira, na madrugada de 17 de dezembro, foi recebida a bala. Houve um tiroteio que durou das três horas da manhã até uma da tarde. Quando começou o tiroteio, todo mudo cuidou de correr para dentro de casa. José Antônio, de 14 anos, filho de d. Marica, lembrou-se do cavalo que estava amarrado num pé de juá, e correu para soltá-lo. Não deu tempo; e o rapaz, estando do lado de fora, foi mortalmente atingido por uma bala. Conquanto o número dos que estavam no Taveira fosse inferior ao dos atacantes, ali havia farta munição. A diligência que saira de Aurora tinha setenta e dois homens, mas pouca munição, que logo se esgotou. Avisado do conflito, Zé Inácio partiu para o Taveira, conduzindo cerca de 50 cangaceiros. Lá chegando, às duas da tarde, já os atacantes haviam batido em retirada.
A morte do filho, naquelas circunstâncias, desencadeou a fúria de D. Marica Macedo, que, incontinente, foi se valer de Dr. Floro, que se encontrava nas imediações. Dr. Floro foi com D. Marica até a presença de Domingos Furtado, e este, sob as alegações de Floro, redigiu um telegrama, para o presidente Nogueira Acioli, pedindo a retirada da tropa estacionada em Aurora. No referido telegrama, que foi assinado por Domingos Furtado, José Inácio e Antônio Joaquim de Santana, os signatários exigiam, uma vez que o seu propósito era destruir a sede do município. Imediatamente, - na mais evidente demonstração de pusilanimidade, Nogueira Acioli – apelido de Babaquara, ordenou a saída do contingente policial.
A Invasão
Por sua vez D. Macedo Macedo contava com o apoio dos seus parentes Antônio Joaquim de Santana e João Raimundo de Macedo, bem como dos amigos Domingos Leite Furtado e Zé Inácio do Barro, junto aos quais instou para que atacassem Aurora e derrubassem da chefia municipal o Cel. Teixeira Neto devendo, para esse fim, reunir o maior número possível de homens armados.
Assim sendo, na véspera do ataque à Aurora, estavam concentrados no Barro cerca de 600 homens armados – do cabra ao cangaceiro – vindos dos valhacautos do Cariri, a saber: Milagres (Domingos Furtado), Missão Velha (Antônio Joaquim de Santana), Barbalha (João Raimundo de Macedo), Barro (José Inácio de Souza), Juazeiro (Floro Bartolomeu), Brejo dos Santos (Chico Chicote), Porteiras (Raimundo Cardoso dos Santos), Santana do Cariri (Felinto da Cruz Neves), Lavras (Gustavo Augusto Lima) e Caririaçu (Pe. Augusto Barbosa de Menezes). Por ordem do presidente Acioli, a tropa foi evacuada na manhã do dia 23 de dezembro, de modo que, às 4 horas da tarde, um verdadeiro exército de bandoleiros pôde entrar na sede municipal, sob o comando do “major” José Inácio. A jagunçada entrou em Aurora sem encontrar qualquer resistência.
Totonho Leite refugiou-se, primeiramente, no sítio de D. Marica Taveira, à margem do riacho do Rosário. Não se sentindo seguro ali, retirou-se para a casa do amigo João Coelho, no sítio Tabocas, onde se escondeu. O esconderijo foi denunciado ao inimigo, e este tratou de prender Totonho, que foi conduzido a cadeia de Lavras, escoltado por cerca de quarenta jagunços que, durante o percurso, lhe dirigiam insultos e palavrões, Totonho conseguiu escapar da cadeia de Lavras e fugiu para a cidade de São João do Rio do Peixe, no oeste paraibano. Ali viveu algum tempo sob a proteção do Pe. Joaquim Cirilo de Sá.
A vila de Aurora tinha uma população de pouco mais de mil pessoas. No dia da invasão, poucas pessoas estavam na vila. A maior parte da população retirou-se para os sítios e fazendas. Dada a situação de abandono, os cangaceiros entraram na igreja, onde passariam a morar. As pessoas que não fugiram sofreram as mais terríveis violências
Manuel Gonçalves, genro do Cel Totonho, permaneceu na vila até um pouco antes da invasão. Pensou em resistir, mas viu que seria inútil. Retirou-se com a família para o sitio Tunga, antiga moradia dos Gonçalves. Aconselhado pela família, pois havia ordem do inimigo para matá-lo, Manuel Gonçalves resolveu mudar-se para a capital do Estado, indo com Zé Lino pegar o trem em Acopiara. De Fortaleza, onde morou cerca de seis meses, emigrou para o Estado do Pará, a fim de cumprir o exílio forçado.
Manuel Gonçalves, genro do Cel Totonho, permaneceu na vila até um pouco antes da invasão. Pensou em resistir, mas viu que seria inútil. Retirou-se com a família para o sitio Tunga, antiga moradia dos Gonçalves. Aconselhado pela família, pois havia ordem do inimigo para matá-lo, Manuel Gonçalves resolveu mudar-se para a capital do Estado, indo com Zé Lino pegar o trem em Acopiara. De Fortaleza, onde morou cerca de seis meses, emigrou para o Estado do Pará, a fim de cumprir o exílio forçado.
Ocupada a vila pela jagunçada,começaram as perseguições aos parentes e amigos de Totonho Leite e Manuel Gonçalves. Os invasores entregaram-se à rapina e à pilhagem, em ações próprias de cangaceiros. O primeiro ato dos invasores foi varejar as casas dos mais abastados, no intuito de se apoderarem de objetos de valor, de armas, de munição e até de gêneros alimentícios. Houve assaltos a residências e casas comerciais, cujas portas foram arrombadas a coices de rifles e a golpes de machado, valendo salientar que os roubos se estenderam às propriedades rurais. Em Aurora, que era uma das vilas mais florescentes do Ceará, havia três lojas de tecido e variedades, pertencentes a Sebastião Alves Pereira – a maior das três – Paulo Gonçalves e Antônio Leite de Oliveira, as quais foram saqueadas.
Antes de ter sua loja invadida, major Sebastião conseguiu salvar parte das mercadorias que ele transportou em costas de animais, quando se retirou com a família para o Cariri. As principais residências – estas eram a de major Sebastião, Paulo Gonçalves, Joaquim Miguel e Antônio Leite –foram arrombadas. Não escapou à sanha e à fereza dos bandoleiros.
Antes de ter sua loja invadida, major Sebastião conseguiu salvar parte das mercadorias que ele transportou em costas de animais, quando se retirou com a família para o Cariri. As principais residências – estas eram a de major Sebastião, Paulo Gonçalves, Joaquim Miguel e Antônio Leite –foram arrombadas. Não escapou à sanha e à fereza dos bandoleiros.
Mas o terror não se restringiu á vila; estendeu-se à zona rural, onde foram depredadas, pilhadas e varridas por incêndios, nada menos de vinte e cinco fazendas, em cujo número, se incluiram todas as propriedades do Cel Totonho. Antônio Leite Gonçalves, que, na época, era o maior proprietário do município, foi o mais prejudicado pelo cangaço: a partir daquele fatídico dezembro de 1908, suas fazendas, principalmente, foram pilhadas e incendiadas. Na Jitirana os invasores saquearam os depósitos de arroz e rapaduras, arrombaram o açude e queimaram cercas.
Com a deposição de Antônio Leite T. Netto, assumiu a intendência Municipal o Sr. Candido Ribeiro Campos,(Seu Cândido do Pavão) pessoa de confiança de Domingos furtado e representante da parcialidade agressiva. Estava consumada a vingança dos inimigos de Teixeira Netto, na verdade, uma vingança muito desproporcional à ofensa de que D. Marica Macedo se considerava vítima.
O que aconteceu em Aurora foi um ato de violência que fez submeter a então vila a uma ocupação com toda aquela seqüência de selvagerias, sem que fosse tomada qualquer providência. Lendo-se o livro História do Ceará e dos Municípios, de Waldery Uchoa, chega-se à conclusão de que Aurora foi a única cidade do Ceará, que foi vítima de invasão, depredação e saque. A ocupação somente terminaria graças á interveniência de uma autoridade religiosa, o Bispo coadjutor de Fortaleza, D. Manuel Antonio de Oliveira Lopes, que ao passar em Aurora, em agosto de 1909, em visita pastoral, exortou os bandidos a que abandonassem o infeliz lugarejo, o que conseguiu com admirável habilidade.
*(Extraído do livro: Aurora – História e Folclore, de autoria do escritor aurorense Amarílio Gonçalves Tavares).
Capturado de: http://www.aurora.ce.gov.br/cultura/texto.asp?id=93 em 10 de setembro de 2011.
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